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Pesquisa, Desenvolvimento e Extensão

Por Renata Ratton Assessora de Comunicação - Vice-Reitoria para Assuntos Acadêmicos
Inovação em saúde

Pesquisas de ponta do Departamento de Química apontam caminhos para atenuação de doenças neurodegenerativas como Parkinson e Alzheimer

À esquerda: uma foto atual do grupo de pesquisa do Prof. Nicolás A. Rey (LABSO-Bio, PUC-Rio); ao centro: pesquisadora do LABSO-Bio realizando estudos bioquímicos no espectrofotômetro UV-Vis; à direita: o Prof. Nicolás A. Rey na XVIII International Conference on Biological Inorganic Chemistry - fotos: divulgação


Doenças neurodegenerativas como o Alzheimer e o Parkinson – a causa de demência e a agregopatia mais comuns no mundo – seguem, há mais de um século, sem tratamentos eficazes, apenas paliativos; mas essa realidade pode mudar, pelo menos no que depender da pesquisa liderada pelo professor Nicolás Rey, do Departamento de Química. Única no país, já conta com importantes avanços voltados ao retardamento dessas patologias e até a uma possível prevenção para casos de origem genética, em perspectiva mais otimista.

“É muito difícil conseguir medicamentos para essas doenças porque são multifatoriais, isto é, diferentes processos ocorrem no organismo ao mesmo tempo, não se trata apenas de causas e efeitos”, observa o professor Nicolás, que conduz, há dez anos, estudos em torno da associação de metais existentes no cérebro, como cobre, ferro e zinco, com a progressão das desordens neurodegenerativas. A relevância das pesquisas é tão grande que já gerou até disputa internacional envolvendo a proteção intelectual da tecnologia, como destaca o diretor da Agência PUC-Rio de Inovação (AgI), professor Bruno Feijó:

– As invenções do professor Nicolás chamaram a nossa atenção pelo potencial no tratamento de doenças degenerativas, tais como Alzheimer, Parkinson, diabetes do tipo 2 e catarata, e pelo impacto no cenário internacional, conforme revelou uma avaliação recente de invenções que realizamos na AGI. Um indicativo da importância da linha de pesquisa do Nicolás é a tentativa de pedido de patente similar, feita por um grupo estrangeiro ao qual estamos nos opondo.

Entendendo a pesquisa – Nos doentes com Alzheimer e Parkinson, proteínas específicas de cada doença começam a se agregar de forma patológica: no caso do Alzheimer, o peptídeo beta-amiloide; no do Parkinson, a alfa-sinucleína. Entretanto, o grupo de pesquisa da PUC-Rio trabalha com a observação experimental de que certos metais presentes no cérebro também interagem com essas proteínas acelerando não apenas a agregação, mas também aumentando o estresse oxidativo, pela geração de radicais livres:

– Já que essas proteínas estão interagindo com os metais existentes no cérebro – piorando em muito a situação dos pacientes – o que estamos tentando fazer é produzir pequenos compostos que funcionem como ‘ladrões’ de metais. Compostos que sequestrem os metais das proteínas, de forma a que estes não interfiram mais na agregação proteica e não contribuam com o estresse oxidativo, ao também diminuir os radicais livres. Obviamente, esses compostos, pertencentes à classe das N-acil-hidrazonas, precisam ter algumas características (não podem ser tóxicos, precisam ser capazes de atingir o cérebro, atravessando a barreira hemato-encefálica, e de interagir com metais de forma apropriada), explica o professor.

De forma resumida, a ideia das pesquisas é interferir em um dos vários caminhos da doença, esperando melhorar alguns dos sintomas. Nicolás imagina que, quando surgir uma cura para o Alzheimer será através de um coquetel de drogas, onde cada uma inutilize uma das vias de manifestação da doença.

Com a retirada dos metais do peptídeo beta-amiloide e da alfa-sinucleína, o que se busca é obter uma progressão mais lenta. Por exemplo: depois que os primeiros sintomas do Alzheimer aparecem, se em dois ou três anos o doente se esqueceria completamente das pessoas com quem convive, com o tratamento, poderia levar sete, oito anos para chegar a esse estágio:

– Parece pouca coisa, mas quem tem ou teve familiares com essa doença sabe que se trata de uma doença que "mata" a pessoa duas vezes, primeiro quando a descaracteriza como ser humano pensante, e depois pela morte propriamente dita. Se conseguirmos adiar e promover mais alguns anos de qualidade de vida será muito importante, sobretudo porque a maioria dos casos ocorre em idades mais avançadas, observa Nicolás.

Uma outra vertente do estudo possibilitaria até mesmo a prevenção da doença em casos genéticos:

– Em um dos estudos em que estamos trabalhando, a aluna injetou o peptídeo beta-amiloide humano agregado no cérebro de camundongos, verificando que, após 24 horas, os animais já começaram a demonstrar sintomas de demência, se comportando de forma estranha, e apresentando problemas de memória. No entanto, ao injetar na barriga de outro animal o composto desenvolvido pelo grupo, antes de injetar as proteínas agregadas no cérebro, observou-se que os animais não desenvolveram demência. Ou seja, utilizando uma substância que quebra a interação entre os metais existentes no cérebro e as proteínas, estas não tiveram efeito nocivo para as cobaias. Ambos os testes foram realizados com um número muito grande de camundongos, salienta o pesquisador.

Ainda de acordo com o professor, os mecanismos por trás do Alzheimer e do Parkinson são muito parecidos. Os sintomas são diferentes porque proteínas distintas precipitam em regiões específicas do cérebro, mas, de forma geral, do ponto de vista inorgânico, há um mecanismo quase unificado que permite estudá-las juntas.

Histórico – Nicolás se interessou por doenças neurodegenerativas assim que foi contratado pela PUC-Rio, em 2009, quando passou a trabalhar em parceria com a professora Judith Felcman, que estudava a Química Inorgânica do cérebro:

– Começamos a fazer colaborações e a coorientar alunos. A Judith tinha essa pegada de estudar o funcionamento do cérebro e eu tinha um interesse mais farmacológico, de procurar resolver problemas relacionados a doenças através de compostos químicos simples. Então, eu pensei um pouquinho e cheguei à conclusão de que seria interessante me aprofundar nas doenças neurodegenerativas, compreendendo um pouco das duas pesquisas; só que, lamentavelmente, a professora Judith faleceu em 2012 e, a partir daí, desenvolvemos a parte farmacológica de forma mais incisiva.

O futuro dos trabalhos está intimamente relacionado a patrocínio ou à continuidade em parceria com grupos internacionais, já que há um longo caminho entre testes em animais e em humanos, ainda sem previsão em função dos altos custos e da infraestrutura necessária.




Publicada em: 17/03/2023