Ensino, Pesquisa e Desenvolvimento
Centro Técnico Científico realizou workshop, no último dia 11, para esclarecer professores e alunos sobre mudanças que representam ruptura com o modelo tradicional de ensino
O Decano do Centro Técnico Científco, Luiz da Silva Mello, falou sobre o impactos das novas diretrizes, junto à Leila Vilela e Dayana Ximenes (detalhe) - Fotos: Renata Ratton, Ascom/Vrac
A bola já está em campo, e em workshop realizado no dia 11 de novembro, o Centro Técnico Científico deu partida nos trabalhos que contemplam a implementação das novas Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Engenharia. O prazo é abril de 2022.
Para o Decano do CTC, professor Luiz da Silva Mello, trata-se de uma enorme mudança, que vai envolver o empenho de professores, alunos e funcionários no desafio de inverter a lógica atual de aprendizagem, no sentido do desenvolvimento de competências, através de projetos de Engenharia.
Sobre as novas diretrizes, a estratégia do Centro e as ações junto a professores e alunos, Silva Mello falou à assessoria de comunicação da Vice-Reitoria para Assuntos Acadêmicos. Junto a ele, a coordenadora geral do Serviço de Orientação ao Universitário do CTC (SOU-CTC), Leila Vilela, e a engenheira Dayana Ximenes, da equipe do SOU.
Qual foi a motivação para a implementação das novas Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Engenharia? A Universidade contribuiu com esses estudos?
Silva Mello – Nosso modelo atual de ensino remonta ao final do século XIX, início do século XX, e foi criado a partir da segunda revolução industrial, ou seja, está direcionado para uma sociedade que não existe mais. Essas novas diretrizes estão sintonizadas com o que está acontecendo, em todo o mundo, na era pós-industrial, da criatividade e das novas ideias. A PUC participa há muitos anos da discussão dos currículos de Engenharia, tem uma inserção muito ativa na Associação Brasileira de Ensino de Engenharia (ABENGE), e grande parte dos pontos que estão nessas novas diretrizes vem dessa discussão. Evidentemente, esse é um esforço nacional, com muitos atores e instituições envolvidas.
Leila Vilela – Os estudantes não aceitam mais participar desse ensino tradicional, desse ensino linear em que o professor é o detentor de todo o saber, quando eles mesmos têm um monte de recursos para obter o conhecimento. Além disso, há a necessidade de interação fora dos muros das universidades, por uma demanda das próprias empresas, da indústria, que querem ter uma mão de obra qualificada em seus ambientes. São inúmeras as razões que levaram à implantação dessas novas DCNs. Elas vão ser a chave para nortear essa nova educação. Só para lembrar, o Núcleo de Educação em Engenharia (NECE), da Universidade, foi criado em 2011 – como a formalização de grupos de estudo que existiam anos antes – principalmente para pensar em um novo curso de Engenharia, com uma participação mais ativa dos alunos em sala de aula. Já precisávamos pensar em como atender a nova geração, nativa em tecnologia.
A PUC tem histórico de inovação em metodologias de ensino e no ensino da Engenharia, que, inclusive, deu origem às disciplinas hands-on e incentivou a criação de programas como o de dupla diplomação. O que muda?
Silva Mello – A mudança é muito grande, não é uma simples reforma curricular para alterar conteúdos ou a estrutura do currículo, mas mantendo o foco nos mesmos conteúdos. O que muda realmente é que a apresentação dos conteúdos passa a se dar em função do desenvolvimento das competências. Vai além do chamado ensino hands-on, é mudar a forma de aprendizagem. Hoje não se fala mais em metodologias de ensino, mas em metodologias de aprendizagem. Os currículos enciclopédicos perderam o sentido, até porque o aluno, futuro profissional, tem um acesso imenso à informação. A mudança também não é apenas aumentar do uso da tecnologia, as tecnologias são uma ferramenta e sua adoção é inevitável, acontece por si só.
O grande desafio é mudar a lógica do processo, desenvolver competências e formar um engenheiro capaz de desenvolver projetos e resolver problemas novos. A aprendizagem passa a ser baseada no desenvolvimento de projetos, com os conteúdos e os conhecimentos básicos sendo apresentados na medida em que as soluções dos problemas os requeiram.
Leila Vilela – O hands-on existe há muitos anos, mas faltava que professores de áreas distintas sentassem juntos para incorporar, em suas próprias disciplinas, os conhecimentos de que os alunos necessitam para trabalhar em um projeto. Hoje, os professores de ciências básicas, por exemplo, estão abrindo suas disciplinas para que os alunos levem suas necessidades de aprendizagem em química, física, matemática, programação, em função do projeto em execução. É um começo, mas é isso que se espera, que tenha essa integração, em cada período, de todas as disciplinas daquele período, e também uma integração vertical, ao longo de todos os períodos do curso.
As diretrizes apontam mais tópicos do que antes existiam. As instituições terão que discriminar as atividades que serão conduzidas junto aos alunos para atingir as competências; como a universidade vai capacitar o corpo docente para trabalhar com essas metodologias de aprendizagem. Há uma objetividade, um detalhamento muito grande. Inclui também a questão do acolhimento, que abrange todas as ações da instituição para que o aluno permaneça no curso, que vão além do apoio psicopedagógico, tutorias, monitorias, interação com professores, alunos, atividades que o SOU-CTC já vem realizando, e que agora são exigências.
Como o CTC recebe e percebe as novas diretrizes?
Silva Mello – Com entusiasmo – o processo ainda está começando, mas percebemos, nos últimos dois anos, uma mudança na atitude e na postura dos professores e alunos, e também com grande preocupação em relação ao tamanho do desafio. O processo vai exigir um trabalho intenso, mas quem já está trabalhando nessa direção está muito empolgado. Em relação à primeira experiência com essas metodologias, que está sendo implementada no curso de Engenharia Civil, o que entusiasma os professores envolvidos é a motivação e envolvimento dos alunos. Quando o aluno está participando de fato, executando as atividades propostas e sendo avaliado pelos resultados destas atividades – realizando uma aprendizagem ativa, em oposição à passiva - a visão de todos sobre o processo muda.
Qual é o plano do CTC para a implementação das mudanças até abril de 2022?
Leila Vilela - A primeira ação concreta foi o workshop do dia 11 de novembro. Agora, toda a comunidade está ciente formalmente do que são as novas diretrizes. No NECE, uma comissão formada por docentes dos grupos estruturantes e coordenadores interessados se reúne quinzenalmente para realizar os estudos das novas diretrizes curriculares e discutir propostas de como implementá-las.
De início, a comissão elaborou um sistema para que os professores das disciplinas atuais possam marcar as competências que suas trabalhadas em cada uma delas, dentro desse novo formato horizontal. Também começamos a elencar que outras comissões vão tratar da coordenação horizontal (por período) e vertical dos cursos. Pretendemos ainda implementar um sistema de acompanhamento do perfil do egresso, do momento em que realiza a colação de grau até seu retorno do aluno para pegar o diploma; queremos saber se, nesse meio tempo, estará empregado, se está trabalhando em sua área de atuação. Precisamos conhecer melhor esse egresso. A comissão também tem uma agenda de capacitação docente, com a criação de professores multiplicadores das novas metodologias dentro do próprio CTC.
Silva Mello - Formalmente, iniciamos o processo com o seminário, mas já havia esforços sendo desenvolvidos, o mais marcante é o projeto integrado que está sendo feito na Engenharia Civil, que servirá um pouco de modelo para o encaminhamento em relação aos outros cursos. No workshop, estamos trazendo o Olin College, um dos pioneiros no mundo na adoção desse tipo de metodologia, além de algumas universidades do Brasil que já estão adiantadas no processo. Vamos ter que andar rápido para fazer uma mudança que é muito grande.
Quem será o futuro egresso da Engenharia da PUC-Rio?
Silva Mello - O detalhamento do perfil do egresso da Engenharia é o primeiro passo do trabalho para a implementação de uma nova forma de aprendizagem, baseada no desenvolvimento de competências. As competências definidas nas novas diretrizes começam, sintomaticamente, pela capacidade de "formular e conceber soluções de Engenharia, analisando e compreendendo a necessidade dos usuários e seu contexto". Para isso, o egresso deve ser capaz de: analisar e compreender os fenômenos físicos e químicos por meio de modelos verificados e validados por experimentação; conceber, projetar e analisar sistemas, produtos, componentes ou processos; implantar, supervisionar e controlar as soluções de Engenharia; comunicar-se eficazmente; trabalhar e liderar equipes multidisciplinares; conhecer e aplicar com ética a legislação; e, muito importante, aprender de forma autônoma e lidar com situações e contextos complexos.
Leila Vilela - Aprender de forma autônoma talvez seja um dos principais desafios na construção do perfil do egresso. Em um mundo que se transforma substancial e velozmente, com profissões que foram esvaziadas e outras que ainda nem existem, é essencial a capacidade do estudante de autodirecionar seu aprendizado, para se adaptar à realidade. É este perfil de profissional que queremos formar, com autonomia intelectual, que saiba utilizar as fontes de informação para atender às suas próprias necessidades de aprendizagem.
A Resolução CNE/CES 11, de 2002 , já apontava e sintetizava muito bem este perfil: “o engenheiro, com formação generalista, humanista, crítica e reflexiva, capacitado a absorver e desenvolver novas tecnologias, estimulando a sua atuação crítica e criativa na identificação e resolução de problemas, considerando seus aspectos políticos, econômicos, sociais, ambientais e culturais, com visão ética e humanística, em atendimento às demandas da sociedade”. É nessa ótica que propomos a orientação do perfil formativo dos nossos estudantes.
Como a transição será trabalhada junto aos alunos?
Silva Mello - Essas mudanças vão no sentido do que os alunos precisam, como futuros profissionais de Engenharia. No momento em que as mudanças começam a acontecer, haverá um equilíbrio maior entre a motivação em sala de aula e a obsessão pelo estágio, que vem sendo o foco dos alunos.
Leila Vilela - A participação dos estudantes é, inclusive, um dos itens das novas diretrizes. A diretora da Abenge Estudantil veio à Universidade para explicar os impactos dessas mudanças aos alunos; antes disso, por sugestão da Dayana Ximenes, também do SOU- CTC, achamos importante trabalhar essas mudanças com os alunos, realizar uma pesquisa sobre o que acham importante.
Dayana Ximenes – Convidamos para participar da discussão alguns alunos que acreditamos representarem bem o CTC, incluindo alunos de alto desempenho que participam do programa TEP, alunos que trabalham com mídias digitais, das equipes de competição e dos diretórios acadêmicos de Engenharia, enfim, um grupo eclético e interessado em aprimorar o ensino. No dia 11, em paralelo ao workshop oferecido para os professores, houve uma palestra específica para os alunos, em que a diretora da Abenge Estudantil explicou essas novas diretrizes. A ideia foi gerar um documento com sugestões dos alunos sobre o que devia ser o curso de Engenharia da PUC-Rio. No dia 11, levamos uma primeira versão, elaborada pelo grupo escolhido, que foi aprimorada, ao longo do dia, e apresentada aos professores no final do workshop.